Decisões TJDGO

VOTO RELATOR PROCESSO 030/2021

05/07/2021

Processo nº 030/2021.

 

 

CAMPEONATO GOIANO DE FUTEBOL PROFISSIONAL 1ª DIVISÃO – 2020.

 

 

Jogo entre:               Vila Nova Futebol Clube e Goiás Esporte Clube.

Data:                          11/02/2021.

Estádio:                     Onésio Brasileiro Alvarenga.

Horário:                     16:00.

 

Recorrentes:           Hugo Jorge Bravo;

Vila Nova Futebol Clube;

Procuradoria do Tribunal de Justiça Desportivo da Federação Goiana de Futebol.

 

Recorrido:               3ª Comissão Disciplinar do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Goiana de Futebol.

 

Relatora:                  Edith Costa Antunes Machado Giolo.

 

 

 

 

EMENTA

 

 

RECURSO VOLUNTÁRIO. INFRAÇÕES AOS ARTIGOS CBJD. CARATER PEDAGÓGICO. IMPEDIMENTO PROCURADOR INOCORRÊNCIA. CONDUTA INCOPATÍVEL DE DIRIGENTE E DO CLUBE. 1. A conduta do dirigente deve ser compatível com o cargo exercido. 2. O clube mandante deve se ater às normas de respeito e civilidade. 3. Impedimento do procurador não caracterizado. Recursos Voluntários desprovidos.

 

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de RECURSO VOLUNTÁRIO apresentado por VILA NOVA FUTEBOL CLUBE em face de decisão proferida pela 3ª Comissão Disciplinar do TJD-GO, cujo voto é de relatoria do auditor relator Leopoldo Siqueira Múndel.

O Vila Nova Futebol Clube apresentou, no dia 13/04/2021, notícia de infração disciplinar, fls. 13/19, para o oferecimento de denúncia face a ação do atleta do Goiás Esporte Clube Miguel Ferreira D., por suposta infração aos artigos 243-D, parágrafo único, 258-A e 258-D do CBJD, bem como a suspensão preventiva do atleta pelo prazo de 30 (trinta) dias.

O Goiás Esporte Clube apresentou, no dia 14/04/2021, notícia de infração disciplinar para o oferecimento de denúncia em face do Vila Nova Futebol Clube, por suposta infração aos artigos 243-G do CBJD.

A Procuradoria, por sua vez, através de peça processual apresentada às fls. 02/11, denuncia Hugo Jorge Bravo, presidente executivo do Vila Nova Futebol clube, por suposta infração contida no artigo 258, § 2º, II do CBJD, o atleta do Goiás Esporte Clube Miguel Ferreira D., por suposta infração contida no artigo 258, caput do CBJD e a equipe do Vila Nova Futebol Clube por suposta infração contida nos artigos 213, I e 243-G do CBJD.

Na súmula e relatório da partida, fls. 26/28, assim foi narrado, in verbis:

 

Informo que aos 22 minutos do primeiro tempo, enquanto a partida estava paralisada, me dirigi até a lateral do campo, próximo a arquibancada onde se encontravam os dirigentes da equipe do Vila Nova F.C e informei ao delegado da partida, senhor Sérgio Albernaz, que o presidente da referida equipe, SR: Hugo Jorge Bravo, estava com conduta inapropriada gesticulando de forma acintosa contra as decisões da arbitragem. Após o fato citado não tivemos mais nenhuma ocorrência.

 

Provas documentais e vídeo juntados às fls. 29/59 dos autos.

Às fls. 78 consta certidão de que o Vila Nova Futebol possui transação disciplinar no processo 025/21, sendo Hugo Jorge Bravo e Miguel Ferreira D primários.

A 3ª Comissão Disciplinar após, discutida e votada à matéria (fls. 79/80), por maioria, aplicou as seguintes penas:

  1. HUGO JORGE BRAVO, como incurso no artigo 258, § 2º, II do CBJD, aplicando-se advertência.
  2. MIGUEL FERREIRA D., como incurso no artigo 258, caput, do CBJD aplicando-se a suspensão de 01 (uma) partida.

Por unanimidade, referida comissão, aplicou as seguintes penas:

  1. VILA NOVA FUTEBOL CLUBE, como incursa nos artigos 213, I do CBJD, aplicando-se multa de 03 (três) salários mínimos (R$ 3.300,00, ou seja, três mil cento e trinta e cinco reais), no prazo de 10 (dez) dias a partir da data do julgamento (29/04/2021).

Em suas razões recursais, inconformados com a decisão da 3ª Comissão Disciplinar os recorrentes Vila Nova Futebol Clube e Hugo Jorge Bravo, argüem em sede de preliminar a anulação do julgamento face a possível suspeição e/ou impedimento do procurador que atuou no feito. No mérito entende pela ausência de tipicidade da conduta imposta ao Vila Nova Futebol Clube e inexistência de ilicitude na conduta praticada pelo diretor Hugo Jorge Bravo, requerendo o provimento do recurso. Fls.81/86

Em suas razões a procuradoria alega que a sansão aplicada ao diretor Hugo Jorge Bravo, deve ser majorada, bem como deve condenar o Vila Nova Futebol Clube nas penas previstas no artigo 243-D do CBJD, requerendo provimento do recurso para majorar as sensações impostas. Fls. 119/128

Não houve recurso por parte do atleta do Goiás Esporte Clube Miguel Ferreira D.

Não foi pedido efeito suspensivo.

Pronunciado o juízo positivo de admissibilidade do recurso desportivo, processo foi devidamente distribuído (fls. 117/118 e 131/132) e incluído em pauta de julgamento para o dia 30/04/2021 às 10:00 (fls. 133), mandado de intimação às fls. 146 e certidão às fls. 147.

É o relato, passo à decisão.

VOTO

Em primeiro momento deve-se analisar a preliminar arguida, que traz a baila a possibilidade de impedimento do procurador Victor Phillip Sousa Naves, noticiando que, em entrevista a Rádio Band 820, antes do julgamento pela Comissão Disciplinar, “deixa claro e transparente a manifestação do nobre procurador, denunciante do referido processo, quando manifestou-se publicamente sobre objeto da causa (sic), ainda a ser processada; causa ainda não julgada”.

Em análise minuciosa às provas contidas nos presentes autos não consegui visualizar qualquer prova ou meio que pudesse corroborar com a narrativa do recorrente em relação às declarações do procurador, por isso, resta prejudicada o pedido de impedimento pela mais pura falta de apoio probatório. Mantenho a decisão da 3ª Comissão Disciplinar neste particular.

Ultrapassada a questão preliminar, passo a analisar o mérito em conjunto, tendo em vista que o recurso da Vila Nova Futebol Clube e Hugo Jorge Bravo pleiteiam a absolvição e o recurso da Procuradoria a majoração da condenação.

No caso em questão a decisão da 3ª Comissão Disciplinar está sendo atacada por ambos os recorrentes, cada qual com suas razões.

Em relação ao dirigente do Vila Nova Futebol Clube, Hugo Jorge Bravo, de antemão mantenho a advertência aplicada.

Sabe-se que gestos, xingamentos são atos normais (não deveriam ser, mas são) de jogos de futebol, existe uma cultura que trata com normalidade ofensas a jogadores, técnicos, auxiliares, árbitros e até “gandulas”. Entretanto tais atitudes devem ser moderadas, sem ofensas a honra, opção sexual, raça ou credo, tendo em vista reiteradas campanhas nacionais e internacionais de conscientização e até criminalização.

Gestos obscenos de um dirigente podem gerar uma série de fatos incontroláveis, tendo em vista que o presidente do time de futebol é a pessoa que deve ser exemplo para jogadores, comissão técnica e TORCIDA.

A súmula da partida deixou claro que “o sr. Hugo Jorge Bravo, estava com conduta inapropriada gesticulando de forma acintosa contra as decisões da arbitragem.” Se o presidente não respeita a arbitragem e faz gestos obscenos para que todos vejam, porque jogadores e demais participantes da partida, integrantes do clube não poderiam fazer o mesmo?

Pois bem, conduta inapropriada deixa claro que não seria uma aceno ou qualquer gesto carinhoso dirigido a alguém, e sim conduta imprópria. A súmula tem a presunção de veracidade e não existe nos autos qualquer prova contrária a súmula que possa trazer fatos novos ou modificativos.

Assim, com intuito pedagógico, para que o dirigente adapte a sua postura ao cargo e responsabilidade exercida perante o futebol goiano, mantenho a condenação da 3ª Comissão Disciplinar, para adverti-lo nos termos do artigo 258, § 2º, II do CBJD.

Já em relação ao Vila Nova Futebol Clube, melhor sorte não cabe aos recursos interpostos. Pretendo, também, acompanhar a decisão da 3ª Comissão Disciplinar por atender ao caráter pedagógico.

Sabe-se que o cenário desportivo vem mudando muito nos últimos tempos, buscando paridade entre gêneros, rechaçando racismo e homofobia. Já não é “divertido” atacar a opção sexual do indivíduo, sendo este heterossexual ou homossexual, não importa, o que se traz como importante é o rendimento do atleta.

O amadorismo nas relações está cada vez mais distante, diria até partindo para a extinção. Não existe mais espaço para ofensas gratuitas, tratamentos homofóbicos, mesmo que seja com intenção de fazer comédia. Não tem graça! É ofensivo.

A recomendação nº 01/2019 do Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol Brasileiro assim recomendou aos clubes[1]: “Que os Clubes e Federações realizem campanhas educativas junto aos torcedores, atletas e demais partícipes das competições com o fim de evitar a ocorrência de infrações desta natureza, o mais breve possível.”

Vale lembrar que é de responsabilidade dos clubes campanhas educativas contra qualquer manifestação homofóbica, não colocar em alto e bom som música que buscam ofensas homofóbicas com intuito de utilizar algo tão sério, como a violência contra LGBTQIAP+, com intuito jocoso, zombeteiro, burlesco.

 

Art. 243-G. Praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:

 

Vejo que a conduta não vai como ato de preconceito a própria opção sexual dos atletas, estas não sabidas e que não são relevantes, mas a ato jocoso no intuito de desabonar a autoestima dos atletas. O artigo é claro em preconceito em razão da origem ou condição e não em provocações jocosas. A aplicação do referido artigo, no meu entendimento, são para condutas diretas.

Além do mais vejo a incoerência do clube em punir o atleta Francesco (fls. 55) e logo após utilizar-se do mesmo expediente, mesmo que de maneira disfarçada para praticar a mesma desumanidade.

Portanto, conclui-se que, neste particular, a decisão da 3ª Comissão Disciplinar também atende o caráter pedagógico e deve ser mantida por seus próprios fundamentos.

Assim, julgo improcedente o recurso voluntário apresentado por Hugo Jorge Bravo e Vila Nova Futebol Clube, e, também, julgo improcedente o recurso apresentado pela Procuradoria do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Goiana de Futebol, mantendo incólume a decisão da 3ª Comissão Disciplinar do TJD/GO por seus próprios e jurídicos fundamentos.

É como voto.

Goiânia, 30 de junho 2021.

 

 

 

EDITH COSTA ANTUNES MACHADO GIOLO

Auditora do Pleno do TJD-FGF

[1] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DESPORTIVA. STJD emite recomendação contra Homofobia. Disponível em https://www.stjd.org.br/noticias/stjd-emite-recomendacao-contra-homofobia. Acessado em 29/06/2021



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